03/09/2014 às 10h09

Desvio de função e os entendimentos da jurisprudência

Por Equipe Editorial

Nome: VOGA SERVICOS CONTABEIS
Email: alexandre@vogasc.com.br
Nome Empresarial: ALEXANDRE CONTABILIDADE
Responsável: Alexandre Caetano dos Reis
CNPJ/CPF: 10.943.907/0001-48
Telefones: 3964-0692
Origem: Multilex


Senha Assinante: reis2014
Prezados Senhores,

A atividade da empresa é de TREINAMENTO EM INFORMÁTICA.
A funções exercidas nessa empresa é de GERENTE ADMINISTRATIVA, RECEPCIONISTA e CONSULTORES DE VENDAS (que vendem cursos de informática).
A GERENTE além de desempenhar as funções ligadas ao cargo, esta interessada em vender os cursos e propôs a empresa o recebimento de uma bonificação.
A jornada de trabalho é de 44 horas semanais de segunda a sexta, mas poderá ocorrer da GERENTE, vender os cursos além do expediente de trabalho.

Diante do exposto, segue abaixo os questionamentos:
1) Essa situação, poderá caracterizar desvio de função?
2) A empresa pode fazer um TERMO ADITIVO ao contrato de trabalho, informando todas as alterações ?
3) A empresa deve computar as horas em que a funcionária trabalhou além do expediente de trabalho?

Desde já, agradecemos a colaboração.


I – Desvio de função;

II – Termo aditivo;

III – Cargo de gerente;

IV – Síntese


As relações contratuais de trabalho podem ser objeto de livre estipulação das partes interessadas em tudo quanto não contravenha às disposições de proteção ao trabalho, aos contratos coletivos que lhes sejam aplicáveis e às decisões das autoridades competentes (Artigo 444 da CLT).

Portanto, o empregador como gestor de seu negócio deve contratar e especificar as regras contratuais. Toda função tem sua especificação constante na Classificação Brasileira de Ocupação (CBO) e existe a descrição sumária de acordo com cada ocupação.

O empregador delimitará as funções a serem exercidas as quais terão seu respectivo piso salarial e poderão estar constante na convenção coletiva de trabalho. Cabe ressaltar que determinados cargos possuem jornada de trabalho diferenciada e peculiar ao cargo.

Logo, diante dessas informações, a empresa depois de estabelecida a função a ser desenvolvida deve estar atenta para que determinado trabalhador não exerça outra função além da qual foi contratado, sob pena de arcar com pagamento de diferença salarial tendo em vista o desvio de função.

I – Desvio de função

Uma vez descritas as tarefas referentes a cada função, ocorrerá DESVIO DE FUNÇÃO, quando o empregado chamado a ocupar uma determinada posição funcional, exerce atribuições previstas para outro cargo, geralmente superior ao seu, melhor dizendo, função diversa a qual fora contratado.

Configurado o desvio de função, o procedimento seria efetivação do empregado na função desviada e o pagamento da diferença salarial com projeção no 13º Salário e Férias, do período em que o empregado iniciou o exercício da função sem receber a remuneração inerente ao cargo.

Relevante seja confrontada as atividades exercidas pelo gerente e as adstritas ao consultor de vendas, conferindo se não existem tarefas em comum a ambas funções com intuito de afastar quaisquer pedido de diferenças salariais pelo empregado.

Por isso, o empregador deve trazer no bojo contratual a descrição de cada função e na ocorrência de alterações, seja procedido o correspondente termo aditivo.

Não há nada que impeça fazer o termo aditivo do contrato de trabalho para que o empregado em comento exerça atividade peculiar a outra função como atividade complementar a que desempenhava, por exemplo.

O Tribunal trabalhista já julgou em relação ao tema desvio de função, consoante acordão abaixo:

“DESVIO FUNCIONAL.ATRIBUIÇÕES AFETAS DO CARGO DE VIGILANTE. COMPROVAÇÃO. DIFERENÇAS SALARIAIS DEVIDAS. O desvio de função tem como nota característica o fato de que o empregado passa a executar atribuições típicas de função diversa daquela para a qual foi contratado, normalmente, mais qualificada, sem a correspondente majoração da remuneração (TRT 10ª Proc 791.2013.015.10.00-5; .3ª Turma; Relator Juiz Denilson Bandeira Coelho; Julgamento em 26.08.2014)

II – Termo aditivo

Nos contratos individuais de trabalho só é lícita a alteração das respectivas condições por mútuo consentimento, e ainda assim desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta garantia, consoante dispõe o  artigo 468 da CLT

Por sua vez, o contrato individual de trabalho poderá ser acordado tácita ou expressamente, verbalmente ou por escrito e por prazo determinado ou indeterminado (artigo 443, CLT).

A postura melhor a ser tomada pelo empregador é aquela de acordo com a norma e que seja passível de ser demonstrado por intermédio de documentos.

III – Cargo de gerente

De acordo com o caso proposto, no caso de a gerente além de desempenhar as suas funções ligadas ao cargo, venha a vender os cursos de informática, extrapolando sua jornada de trabalho, não deverá pleitear horas extras, diante ao que dispõe o artigo 62, II da CLT.

Nesse sentido, É necessário se observar os requisitos inerentes ao cargo de gerente para que as horas excedentes a jornada normal de trabalho não sejam assim consideradas, conforme a CLT determina:

Art. 62 – Não são abrangidos pelo regime previsto neste capítulo:

II – os gerentes, assim considerados os exercentes de cargos de gestão, aos quais se equiparam, para efeito do disposto neste artigo, os diretores e chefes de departamento ou filial.

Parágrafo único – O regime previsto neste capítulo será aplicável aos empregados mencionados no inciso II deste artigo, quando o salário do cargo de confiança, compreendendo a gratificação de função, se houver, for inferior ao valor do respectivo salário efetivo acrescido de 40%.

Via de regra as empresas deduzem argumentos em favor da tese de suas defesas, fundada na incidência do art. 62, II, da CLT, o qual dispõe sobre a exceção ao regime de jornada legalmente previsto.

Há que se destacar, inicialmente, que o mero pagamento de gratificação superior a do cargo efetivo não se revela suficiente para se impor ao empregado jornada não demarcada por horas extras. Mister se faz que as atribuições efetivas do empregado sejam revestidas de condições especiais que exijam uma fidúcia extraordinária, diferenciada daquela já inerente a todo contrato de trabalho.

O Tribunal do Trabalho já firmou o entendimento de que devem andar de mãos dadas os requisitos do poder de gestão efetivo e salário superior aos subordinados para que a jornada seja livre e não seja considerada horas extras aquelas que passar da jornada normal de trabalho, consoante julgados a ser transcritos:

ART. 62, II, DA CLT. CARGO DE CONFIANÇA. PODER DE MANDO E GESTÃO. NÃO CONFIGURAÇÃO. HORAS EXTRAS E INTERVALO INTRAJORNADA. O conjunto probatório afasta o enquadramento do obreiro na exceção prevista no art. 62, II, da CLT, estando ele, portanto, subsumido à carga horária de trabalho normal de 8 horas diárias e 44 horas semanais. Assim, a teor do art. 74, §§2º e 3º, da CLT, era obrigação da reclamada fixar e proceder o registro da jornada de trabalho do reclamante e se, sem qualquer justificativa plausível, não o fez, foi por sua conta e risco, não podendo beneficiar-se de sua própria negligência, tendo como consequência, à luz da Súmula nº 338 do TST, ter-se por verídico o alegado quanto à jornada ordinária, inclusive no tocante ao intervalo, já que não elidido por prova em contrário, sendo devidas as horas extras, na forma deferida na origem. (TRT 10ª Processo nº 14.2013.005.10.00-2ª Turma; Relator Juiz Mário Macedo Fernandes Caron; Julgamento em 14.05.14)

CARGO DE CONFIANÇA. REQUISITOS OBJETIVOS. Para caracterização do cargo de confiança, necessária a demonstração do poder de mando e a autonomia administrativa, além da remuneração mais elevada para fazer frente às responsabilidades inerentes. A mera designação ou intitulação em cargo de fidúcia, sem a devida contraprestação salarial compensatória, não é bastante a retirar o empregado do regime legal de horas extras. (TRT 10ª Região; Processo 1939-2013-102-10-00-0 RO; 1ª Turma; Juiz Relator Dorival Borges de Souza Neto; Julgamento 06.08.14)

Portanto, para enquadramento do empregado na excepcionalidade do inciso II do art. 62 da CLT, é fundamental a presença do poder de gestão e o exercício de atividades de grau mais elevado do que os demais funcionários dentro de uma estrutura de trabalho, de sorte que o detentor desse cargo passe a maior parte do tempo determinando a execução de tarefas. Necessário, ainda, o requisito objetivo inserido no parágrafo único do dispositivo em foco, pertinente à comprovação do padrão salarial mais elevado no percentual mínimo de 40% do cargo efetivo.

Por conseguinte, a empresa se exime do pagamento de horas extras com essa conjugação de elementos acima revelas, como a presença do poder de gestão e de subordinados, não sendo suficiente para tanto a simples ausência de controle de jornada.


Ante o exposto, o desvio de função somente será configurado se o gerente exercer atividades totalmente inerentes a outro cargo. O fato de algumas atribuições serem em comum não significa desvio de função.

O cargo de gerente em consonância ao que dispõe o artigo 62, II da CLT não culmina o pagamento de horas extras.

(ALSC: Revisado em 03/09/14)


Antonio Sagrilo

Consultor Empresarial

OAB/DF 14.380

 

Eduardo Mendonça

Consultor Empresarial

OAB/DF 26.140