01/02/2019 às 23h02

Nova CLT:tempo gasto no deslocamento não é mais considerado horas trabalhadas?

Por Equipe Editorial

Nome: ORGANIZAÇÃO CONTABIL RGE LTDA ORGANIZAÇÃO CONTABIL RGE
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Responsável: RAIMUNDO GERALDO MACHADO DA SILVA
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Origem: Multilex

A consulente solicita parecer, nos seguintes termos:

Senha Assinante: SARAR3SAIOJ

Boa tarde!

GOSTARIA DE SABER SE O TEMPO GASTO ENTRE A RESIDENCIA DO TRABALHADOR E O LOCAL ONDE O MESMO IRA PRESTA SERVIÇOS SÃO COMPUTADOS COMO HORAS TRABALHADAS, JÁ QUE O MESMO NÃO PASSA NA EMPRESA E VAI DIRETO AO LOCAL ONDE FOI REQUISITADO O SERVIÇO?

OBS. TRABALHADOR VAI COM O CARRO DA EMPRESA COM HORA MARCADA, E O MESMO TEM A CIÊNCIA QUE ATUA NA ÁREA EXTERNA.


I – Tempo de Deslocamento

II – Trabalho Externo

III – Jurisprudência

IV – Síntese Conclusiva


I – Tempo de Deslocamento

    Atualmente, o tempo de deslocamento do empregado, de sua residência para o trabalho, e vice-versa, chamado de horas in itinere, não é contado como jornada de trabalho, nem mesmo quando, tratando-se de local de difícil acesso ou não servido por transporte público, o empregador fornecer a condução. Até 10 de novembro de 2017, nessa única hipótese era o deslocamento contado como jornada de trabalho.

    Porém, desde o início da vigência da Reforma Trabalhista (11 de novembro de 2017), o   tempo despendido pelo empregado desde a sua residência até a efetiva ocupação do posto de trabalho e para o seu retorno, caminhando ou por qualquer meio de transporte, inclusive o fornecido pelo empregador, não será computado na jornada de trabalho, por não ser tempo à disposição do empregador (Nova CLT, art. 58, § 2º, na redação dada pela Lei nº 13.467/17).

    Apenas para registro, vale informar que constava na legislação revogada que poderiam ser fixados, para as microempresas e empresas de pequeno porte, por meio de acordo ou convenção coletiva, em caso de transporte fornecido pelo empregador, em local de difícil acesso ou não servido por transporte público, o tempo médio despendido pelo empregado, bem como a forma e a natureza da remuneração.

    Assim sendo, nos termos da legislação vigente, o tempo gasto entre a residência do trabalhador e o local onde o mesmo irá prestar serviços não é computado como hora(s) trabalhada(s). Nesse sentido, matéria de lavra de nossa Equipe Editorial, publicada em 14/12/2018 com o título “8 dicas para reduzir encargos da folha em 2019”, cujo link é http://multilex.com.br/2018/12/14/8-dicas-para-reduzir-encargos-da-folha-em-2019/ (acesso em 04/02/2019).

    O fato de a prestação de serviços se dar em local distinto do estabelecimento da empregadora, sendo um estabelecimento de terceiro (tomador de serviços) não afeta essa conclusão, tampouco a característica de o empregado utilizar carro da empresa para o deslocamento residência-trabalho e trabalho-residência, bem como para outros deslocamentos no decorrer de sua jornada de trabalho, já que realiza trabalho externo, atendendo os clientes da empregadora nos locais por ela indicados.

     Frise-se que a legislação destaca que mesmo no caso de transporte fornecido pelo empregador para o deslocamento casa-trabalho e vice-versa não há cômputo como jornada de trabalho, não sendo requisito para essa certeza haver ou não o trabalho externo, o qual, por suas peculiaridades, inclusive as relacionadas à jornada de trabalho, merece comentários à parte.

II – Trabalho Externo

      Quando, na realização de trabalho externo, for incompatível a fixação de horário de trabalho, as regras concernentes à duração do trabalho do empregado (como jornada de trabalho e horas extras) não serão aplicáveis ao trabalhador externo.

    Nesse sentido, vale conferir o texto celetista, com destaques acrescidos:

Art. 62 – Não são abrangidos pelo regime previsto neste capítulo:                    

I – os empregados que exercem atividade externa incompatível com a fixação de horário de trabalho, devendo tal condição ser anotada na Carteira de Trabalho e Previdência Social e no registro de empregados;    

II – os gerentes, assim considerados os exercentes de cargos de gestão, aos quais se equiparam, para efeito do disposto neste artigo, os diretores e chefes de departamento ou filial.              

III – os empregados em regime de teletrabalho.   (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)         (Vigência)

(…)

 (destaques acrescidos)

     Assim, o fato de o trabalho ser externo não vai necessariamente impedir o controle da jornada de trabalho do empregado, principalmente diante da existência de tantas tecnologias na modernidade, aptas a efetivar o dito controle.

    Nesse tema, entendimento similar ao que é aplicado aos empregados em regime de teletrabalho vale para os empregados em regime de trabalho externo. Confira como se pronunciou o Ministério do Trabalho:

 

Trabalhador no sistema de “teletrabalho” não recebe horas extras e adicional noturno? Veja a discussão

GABINETE DO MINISTRO

DESPACHO DE 26 DE MARÇO DE 2018

O MINISTRO DE ESTADO DO TRABALHO – SUBSTITUTO, no uso de suas atribuições legais, resolve acolher o opinativo da Assessoria Especial de Apoio ao Ministro exarado na Nota Técnica nº 21/2018/CGAT/AESAM para conceder força executória ao Parecer Jurídico 00002/2018/CONJURMTB/ CGU/AGU referente à aplicabilidade da Lei nº 13.467, de 14 de julho de 2017.

HELTON YOMURA

 

ANEXO

PARECER Nº 00002/2018/CONJUR-MTB/CGU/AGU

NUP: 46010.001823/2017-91

(…)

CONCLUSÃO

Pelo exposto, entende-se que, regra geral, os empregados que trabalham em teletrabalho não estão abrangidos pelo regime de jornada de trabalho, estando excluídos da proteção da jornada, bem como dos demais direitos provenientes do Título II da CLT, tais como, adicional noturno, horas extras ou qualquer outro que seja auferido por meio de controle da jornada de trabalho.

No entanto, caso sofram fiscalização dos períodos de conexão telemática, localização física ou qualquer outro meio capaz de controlar o horário do início e término do seu labor diário ou semanal, enquadrar-se-ão na disposição do art. 7° da CF/88 e possuem direito à proteção da jornada, inclusive eventuais horas extras etc.

Restitua-se o presente processo ao Gabinete do Ministro para ciência desse opinativo e providências cabíveis.

À consideração superior.

Fonte: Parecer nº 00002/2018/CONJUR-MTB/CGU/AGUNUP: 46010.001823/2017-91 – www.multilex.com.br – acesso em 04/02/2019 – destaques acrescidos.

    Portanto, pode haver na realidade laboral, sem afronta às leis trabalhistas, empregado que realiza trabalho externo com controle de sua jornada de trabalho, na qual não estará incluído o tempo de deslocamento residência-trabalho e vice-versa, deslocamento que no caso concreto é feito em carro da empresa empregadora.

III – Jurisprudência

    Por oportuno, citamos a jurisprudência sumulada do Tribunal Superior do Trabalho (TST), consolidada a partir do texto da antiga CLT, antes de sua alteração pela Lei da Reforma Trabalhista.

    A propósito, em virtude da Reforma, o próprio TST vem manifestando a necessidade de revisar seus entendimentos:

TST se reúne na terça-feira para discutir jurisprudência pós-reforma trabalhista

O Pleno do Tribunal Superior do Trabalho se reúne na próxima terça-feira (6), a partir da 14h, para discutir as alterações de sua jurisprudência em função das mudanças na CLT introduzidas pela reforma trabalhista (Lei 13.467/2017).

O ponto de partida dos debates é uma proposta, elaborada pela Comissão de Jurisprudência e Precedentes Normativos do Tribunal em novembro do ano passado, que trata de 34 temas que foram objeto de mudança legislativa, entre eles horas de deslocamento (in itinere), diárias de viagem e supressão de gratificação de função. Veja aqui e aqui as propostas da comissão.

“Não há dúvidas de que, a partir da entrada em vigor da reforma trabalhista, em 11/11/2017, muitas súmulas precisam ser revistas”, afirma o presidente do TST, ministro Ives Gandra Martins Filho.

(…)

De acordo com as regras estabelecidas pela própria Reforma Trabalhista em relação à aprovação e alteração de súmulas, a sessão contará com a participação de entidades sindicais de trabalhadores e patronais, entidades de classe (associações de advogados e de magistrados, entre outras) e órgãos públicos (Ministério Público do Trabalho e Advocacia-Geral da União). Cada grupo terá 30 minutos para sustentações orais, totalizando duas horas.

(…)

Fonte: http://www.tst.jus.br/web/guest/busca-noticias – acesso em 04/02/2019 – destaques acrescidos.

     Quanto ao entendimento sumulado pelo TST em período anterior à Reforma, segue:

SÚMULA 90 DO TST – HORAS "IN ITINERE". TEMPO DE SERVIÇO (incorporadas as Súmulas nºs 324 e 325 e as Orientações Jurisprudenciais nºs 50 e 236 da SBDI-I) – Res. 129/2005, DJ 20, 22 e 25.04.2005

I – O tempo despendido pelo empregado, em condução fornecida pelo empregador, até o local de trabalho de difícil acesso, ou não servido por transporte público regular, e para o seu retorno é computável na jornada de trabalho. (ex-Súmula nº 90 – RA 80/1978, DJ 10.11.1978)

II – A incompatibilidade entre os horários de início e término da jornada do empregado e os do transporte público regular é circunstância que também gera o direito às horas "in itinere". (ex – OJ nº 50 da SBDI-I- inserida em 01.02.1995)

III – A mera insuficiência de transporte público não enseja o pagamento de horas "in itinere". (ex – Súmula nº 324 – Res. 16/1993, DJ 21.12.1993)

IV – Se houver transporte público regular em parte do trajeto percorrido em condução da empresa, as horas "in itinere" remuneradas limitam-se ao trecho não alcançado pelo transporte público. (ex – Súmula nº 325 – Res. 17/1993, DJ 21.12.1993)

V – Considerando que as horas "in itinere" são computáveis na jornada de trabalho, o tempo que extrapola a jornada legal é considerado como extraordinário e sobre ele deve incidir o adicional respectivo. (ex – OJ nº 236 da SBDI-I – inserida em 20.06.2001)

SÚMULA 320 DO TST – HORAS "IN ITINERE". OBRIGATORIEDADE DE CÔMPUTO NA JORNADA DE TRABALHO (mantida) – Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003

O fato de o empregador cobrar, parcialmente ou não, importância pelo transporte fornecido, para local de difícil acesso ou não servido por transporte regular, não afasta o direito à percepção das horas "in itinere".

SÚMULA 429 DO TST – TEMPO À DISPOSIÇÃO DO EMPREGADOR. ART. 4º DA CLT. PERÍODO DE DESLOCAMENTO ENTRE A PORTARIA E O LOCAL DE TRABALHO – Res. 174/2011, DEJT divulgado em 27, 30 e 31.05.2011

Considera-se à disposição do empregador, na forma do art. 4º da CLT, o tempo necessário ao deslocamento do trabalhador entre a portaria da empresa e o local de trabalho, desde que supere o limite de 10 (dez) minutos diários.

    Sobre a mudança da jurisprudência, segue notícia de fato que demonstra o novo cenário jurídico, trabalhista e social:

Vale e sindicatos assinam no TST primeiro acordo coletivo sobre tema alterado pela Reforma Trabalhista

O acordo trata das horas de deslocamento, suprimidas pela Reforma.

A Vale S.A. e os Sindicatos dos Trabalhadores da Extração do Ferro e Metais Básicos de Marabá (PA) e regiões e dos Trabalhadores das Indústrias de Extração de Ferro e Metais Básicos de Belo Horizonte (BH) e regiões assinaram na tarde desta quarta-feira (5) acordo coletivo de trabalho (ACT) que teve como base proposta apresentada pelo vice-presidente do Tribunal Superior do Trabalho, ministro Renato de Lacerda Paiva.

O ponto central da negociação foi a cláusula que trata das horas in itinere, ou de deslocamento, relativa ao período 2018-2019.

Reforma

As horas in itinere (tempo despendido pelo empregado entre sua residência e a efetiva ocupação do posto de trabalho) foram suprimidas pela Lei 13.467/2017 (Reforma Trabalhista) e deixaram de ser computadas na jornada de trabalho como tempo à disposição do empregador. O acordo assinado hoje suprime as horas de deslocamento, mas prevê, como contrapartida, um prêmio semestral atrelado à assiduidade, garantido por dois anos, com o compromisso da Vale de renovação por mais dois anos.

Perdas

Segundo o representante do sindicato mineiro, as horas in itinere representavam de 9% a 30% do salário dos empregados. “Seria uma perda muito significativa a sua extinção”, observou. Durante a audiência, as partes agradeceram a Vice-Presidência do TST pela atuação “neste momento de mudança da legislação, para garantir a pacificação dos conflitos”.

(…)

Fonte: Processo PMPP 1000774-61.2018.5.00.0000http://www.tst.jus.br/web/guest/busca-noticias – acesso em 04/02/2019 – destaques acrescidos.


        Pelo exposto, podemos concluir:

  • o tempo gasto entre a residência do trabalhador “até a efetiva ocupação do posto de trabalho” não são computados como horas trabalhadas;
  • não configura afronta às leis trabalhistas o empregado realizar trabalho externo com controle de sua jornada de trabalho (pode também não haver tal controle), sendo que na sua jornada de trabalho não será incluído o tempo in itinere, ainda que o deslocamento seja feito em carro da empresa empregadora;
  • não são abrangidos pelo regime de regras de duração do trabalho (limite de jornada, hora extras, descansos etc) os empregados que exercem atividade externa incompatível com a fixação de horário de trabalho, devendo tal condição ser anotada na CTPS e no registro de empregados.

 (ALSC: Revisado 2019/02/07)



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Antônio Sagrilo
Consultor Empresarial
OAB/DF 14.380

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Ana Beatriz Ferreira
Consultora Empresarial
OAB/DF 24.273