26/08/2015 às 23h08

Filial é uma espécie de estabelecimento que pode responder pelas dívidas da Matriz

Por Equipe Editorial

Trata-se de recurso especial interposto pela Fazenda Nacional, com amparo nas alíneas “a” e “c”  do inciso III do art. 105 da Constituição Federal, contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região que manteve decisão que indeferira, em execução fiscal, o bloqueio eletrônico de depósitos de titularidade de filiais da executada.

Patrimônio da Filial

No âmbito do direito privado, cujos princípios gerais, à luz do art. 109 do CTN, são informadores para a definição dos institutos de direito tributário, a filial é uma espécie de estabelecimento empresarial, fazendo parte do acervo patrimonial de uma única pessoa jurídica, partilhando dos mesmos sócios, contrato social e firma ou denominação da matriz. Nessa condição, consiste, conforme doutrina majoritária, em uma universalidade de fato, não ostentando personalidade jurídica própria, não sendo sujeito de direitos, tampouco uma pessoa distinta da sociedade empresária. Cuida-se de um instrumento de que se utiliza o empresário ou sócio para exercer suas atividades.

A discriminação do patrimônio da empresa, mediante a criação de filiais, não afasta a unidade patrimonial da pessoa jurídica, que, na condição de devedora, deve responder com todo o ativo do patrimônio social por suas dívidas, à luz de regra de direito processual prevista no art. 591 do Código de Processo Civil, segundo a qual “o devedor responde, para o cumprimento de suas obrigações, com todos os seus bens presentes e futuros, salvo as restrições estabelecidas em lei”.

O princípio tributário da autonomia dos estabelecimentos, cujo conteúdo normativo preceitua que estes devem ser considerados, na forma da legislação específica de cada tributo, unidades autônomas e independentes nas relações jurídico-tributárias travadas com a Administração Fiscal, é um instituto de direito material, ligado à questão do nascimento da obrigação tributária de cada imposto especificamente considerado, e não tem relação com a responsabilidade patrimonial dos devedores prevista em um regramento de direito processual, ou com os limites da responsabilidade dos bens da empresa e dos sócios definidos no direito empresarial.

Distinção nas obrigações

A obrigação de que cada estabelecimento se inscreva com número próprio no CNPJ tem especial relevância para a atividade fiscalizatória da administração tributária, não afastando a unidade patrimonial da empresa, cabendo ressaltar que a inscrição da filial no CNPJ é derivada do CNPJ da matriz.

Nessa toada, limitar a satisfação do crédito público, notadamente do crédito tributário, a somente o patrimônio do estabelecimento que participou da situação caracterizada como fato gerador é adotar interpretação absurda e odiosa. Absurda porque não se concilia, por exemplo, com a cobrança dos créditos em uma situação de falência, onde todos os bens da pessoa jurídica (todos os estabelecimentos) são arrecadados para pagamento de todos os credores, ou com a possibilidade de responsabilidade contratual subsidiária dos sócios pelas obrigações da sociedade como um todo (v.g. arts. 1.023, 1.024, 1.039, 1.045, 1.052, 1.088 do CC/2002).

Os fundamentos podem ser assim sumariados:

a) Independência entre a empresa matriz e suas filiais, tendo em vista o princípio da autonomia do estabelecimento; e

b) diversidade de inscrições perante o Cadastro Nacional das Pessoas  Jurídicas, de sorte que, para fins fiscais, matriz e cada filial seriam tidas como estanques quanto  às suas obrigações (e-STJ, fls. 195/200).

Filial é um estabelecimento

O conceito de estabelecimento, cujo instituto da filial, como dito, é uma espécie, está  previsto em lei, encontrando-se estatuído no art. 1.142 do Código Civil, segundo o qual “considera-se estabelecimento todo complexo de bens organizado, para exercício da empresa, por empresário, ou por sociedade empresária “. Trata-se, nos dizeres de Rubens Requião, de um instrumento de que se utiliza o empresário para exercer suas atividades (Curso de Direito Comercial. 21ª ed., v. 1, p. 203-204).

Em que pese a formulação, no decorrer da evolução histórica do instituto jurídico em comento, de nove teorias diferentes explicando sua natureza (cf. COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 13ª ed., v. 1, p. 99), prevalece, na atualidade, a concepção de que se trata de uma universalidade de fato, por ser um conjunto de bens que não perdem a sua natureza e são mantidos unidos, porque destinados a um fim, por vontade do seu proprietário (REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. 21ª ed., v. 1, p. 203-204).

É pacífico, outrossim, o entendimento de que o estabelecimento não ostenta personalidade jurídica própria, não constituindo sujeito de direitos.

Verifica-se, portanto, que a filial, na condição de espécie de estabelecimento, é um bem, um instrumento, uma universalidade de fato que integra o patrimônio da sociedade empresária e não uma pessoa distinta desta. Destarte, a discriminação do patrimônio da empresa, mediante a criação de filiais, não afasta a unidade patrimonial da pessoa jurídica, que, na condição de devedora, deve responder com todo o ativo do patrimônio social por suas dívidas, à luz de regra de direito processual prevista no art. 591 do Código de Processo Civil, segundo a qual “o devedor responde, para o cumprimento de suas  obrigações, com todos os seus bens presentes e futuros, salvo as restrições estabelecidas em lei”.

Decisão STJ

Essa conclusão, aliás, independe da invocação da regra de solidariedade prevista no art. 124 do CTN, segundo a qual, “são solidariamente obrigadas: as pessoas que tenham interesse comum na situação que constitua o fato gerador da obrigação principal”.

Conforme exposto, as filiais não são “pessoas” distintas de sua sede, de sorte que, nesse contexto, a obrigação tributária é da sociedade empresária como um todo, composta por suas matrizes e filiais.

De igual modo, o fato das filiais possuírem número individual no CNPJ não conduz à conclusão diversa da que ora se propõe, sobretudo, porquanto a legislação que disciplina o cadastro não dá respaldo a entendimento contrário.

Destarte, verifica-se que os valores depositados em nome das filiais estão sujeitos às dívidas tributárias da matriz, impondo-se, na espécie, o reconhecimento da ocorrência de violação ao disposto em lei federal.

Fontes: Recurso Especial (Repetitivo) nº 1.355812-RS, 1ª Seção STJ, acórdão DJ-e 31/05/13.e Transito em Julgado 09/08/13.