23/06/2015 às 06h06

Juiz pode fixar multa pelo não cumprimento de decisão até em valor superior ao valor da causa

Por Equipe Editorial

As astreintes (multa imposta pelo Juiz) não têm cunho indenizatório ou compensatório. Tal multa evidencia-se como meio de coação para cumprimento de decisão judicial. Assim, considerando a renitência da empresa agrava no cumprimento do ato decisório, mister majorar a multa com fincas na proporcionalidade/razoabilidade

Valor da Multa

Na origem, a ação ordinária ajuizada pelo produtor contra a (…) foi julgada procedente para rescindir os contratos celebrados entre eles que previam a compra e venda de 35.000 sacas de soja de 60 Kg no valor total de R$ 1.065.850,00 (um milhão sessenta e cinco mil oitocentos e cinquenta reais), tendo esta última sido condenada a devolver àquele somente 8.673,88 sacas do produto, entregues e não pagas, sob pena de multa diária, no caso de atraso, fixada no valor de R$ 2,00 (dois reais) por saca.

Valor arbitrado para a multa no caso de descumprimento da ordem judicial que não foi exorbitante. Multiplicando-se seu valor (R$ 2,00) pelo número de sacas de soja de 60Kg que deveriam ser entregues (8.673,88), tem-se a astreinte diária de R$ 17.347,76 que, comparado ao correspondente às referidas sacas, R$ 264.144,42, não se mostra exagerada e atende aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

A doutrina capitaneada pelo destacado autor NÉLSON NERY JÚNIOR demonstra que “o juiz não deve ficar com receio de fixar o, valor em quantia alta, pensando no pagamento. O objeto das astreintes não é obrigar o réu a pagar o valor da multa, mas obrigá-lo a cumprir a obrigação na forma específica. A multa é apenas inibitória. Deve ser alta para que o devedor desista de seu intento de não cumprir a obrigação específica. Vale dizer, o devedor deve sentir ser preferível cumprir a obrigação na forma específica a pagar o alto valor da multa fixada pelo juiz” (Código de Processo Civil Comentado. IIª edição. Editora: RT. São Paulo. 2010. FI. 702)

Muitos Recursos

O valor de multa cominatória pode ser exigido em montante superior ao da obrigação principal.O objetivo da astreinte não é constranger o réu a pagar o valor da multa, mas forçá-lo a cumprir a obrigação específica. Dessa forma, o valor da multa diária deve ser o bastante para inibir o devedor que descumpre decisão judicial, educando-o. Nesse passo, é lícito ao juiz, adotando os critérios da razoabilidade e da proporcionalidade, limitar o valor da astreinte, a fim de evitar o enriquecimento sem causa, nos termos do § 6º do art. 461 do CPC. Nessa medida, a apuração da razoabilidade e da proporcionalidade do valor da multa diária deve ser verificada no momento de sua fixação em cotejo com o valor da obrigação principal.

Com efeito, a redução do montante total a título de astreinte, quando superior ao valor da obrigação principal, acaba por prestigiar a conduta de recalcitrância do devedor em cumprir as decisões judiciais, bem como estimula a interposição de recursos com esse fim, em total desprestígio da atividade jurisdicional das instâncias ordinárias. Em suma, deve-se ter em conta o valor da multa diária inicialmente fixada e não o montante total alcançado em razão da demora no cumprimento da decisão. Portanto, a fim de desestimular a conduta recalcitrante do devedor em cumprir decisão judicial, é possível se exigir valor de multa cominatória superior ao montante da obrigação principal.

Dosagem da Multa

Consoante o entendimento da Segunda Seção, é admitida a redução do valor da astreinte quando a sua fixação ocorrer em valor muito superior ao discutido na ação judicial em que foi imposta, a fim de evitar possível enriquecimento sem causa. Todavia, se a apuração da razoabilidade e da proporcionalidade se faz entre o simples cotejo do valor da obrigação principal com o valor total fixado a título de astreinte, inquestionável que a redução do valor da última, pelo simples fato de ser muito superior à primeira, prestigiará a conduta de recalcitrância do devedor em cumprir as decisões judiciais, além do que estimulará os recursos com esse fim a esta Corte Superior, para a diminuição do valor devido, em total desprestígio da atividade jurisdicional das instâncias ordinárias, que devem ser as responsáveis pela definição da questão, e da própria efetividade da prestação jurisdicional.

Fontes: Recurso Especial nº 1.352.426-GO, 3ª Turma STJ, acórdão DJ-e 18/5/2015.